Tudo à mão? A geração Y e a agonia da curiosidade

Cristina PanellaColunas

Venho me surpreendendo ao conversar com diferentes parceiros, fornecedores, colegas de trabalho, candidatos a uma vaga em minha empresa ou amigos mais jovens. Ao conversar ou apresentar uma idéia, demanda ou projeto, na maioria das vezes demonstram uma calma e tranquilidade pouco habituais nesses momentos. Passado o primeiro contato, o que parecia, em um primeiro momento, sinal de maturidade no raciocínio termina por revelar uma pseudo-segurança proveniente de certezas construídas a cliques nos motores de busca. Mais grave, parece que, para muitos, a palavra curiosidade não tem mais nenhum sentido intelectual e é reservada àquela sensação incômoda e ao mesmo tempo excitante de querer saber a “última”.

Pouquíssimos são aqueles que, face a uma questão desconhecida ou uma nova temática, procuram construir um conhecimento a respeito. Buscar uma bibliografia sobre o assunto? Coisa de intelectual e de gente que tem tempo a perder! Procurar discutir com especialistas, ainda que em torno do copo de café da tarde? Entendiante! Afinal, para que buscar construir ou aprofundar uma questão se, à mão, encontram-se sistemas de busca que retornam milhares de referências? E mais: é possível até integrar grupos de discussão na rede social que já trazem, em seus títulos, as respostas às questões que são colocadas.

A maioria da geração “Y”, tão festejada pela ruptura que promoveria, acostumou-se a simplesmente estender a mão – na realidade o mouse – no momento em que uma dúvida aparece. E grande parte toma a primeira informação como suficientemente verídica, aprofundada e suficiente para o que necessitam. Raramente serão confrontados. Afinal, seus pares, na maioria das vezes, têm o mesmo comportamento… e valores. Não confirmam dados, não cotejam informações, não memorizam ou tomam notas (nem mesmo em seus smartphones) e, principalmente, não constróem uma opinião a partir do que pesquisaram. Para quê? Quando e se necessário, bastará clicar outra vez..

Tenho convicção que muita informação interessante pode ser, dessa forma, colhida. Obviamente, todas as novas formas de busca também fazem parte do conjunto de ferramentas a que recorro. Mas abandonar a dúvida sistemática que representa o alicerce de nosso raciocínio ou contentar-se com leads em vez de mergulhar em uma argumentação, muitas vezes controversa, retira dos atores que somos o papel principal: o de protagonista do crescimento individual e de nossa história.

Mais uma vez, afirmo: nada tenho contra a tecnologia e recursos digitais. Sou até meio geek. Mas tenho claro que ao tomarmos informação por conhecimento, caímos na armadilha de substituir o segundo pela primeira. E esquecemos o ensinamento básico que postula que só há conhecimento quando se coloca em relação pelo menos duas informações. É o individuo, sujeito de sua história e da construção de seu conhecimento que articula idéias. Nenhum software ainda foi capaz disso.

Com o tempo, a curiosidade, esse motor por excelência das descobertas, grandes e pequenas, se atrofia e entra em lenta agonia. Mantendo-se esse comportamento, em pouco tempo – provavelmente menos que uma geração – neurônios não terão outra função que a de garantir a agilidade dos gestos e a história ficará registrada em eventos acessíveis por links patrocinados.

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