Quem já não se viu – perante um questionário utilizado como roteiro por um entrevistador, um formulário a preencher no papel ou, pior ainda, na internet – diante da falta de opção adequada de resposta dentre as diferentes oferecidas?
Dentre os diferentes cuidados a tomar, dois temas merecem especial atenção: a categorização de respostas – das opções que são oferecidas em um questionário (alternativas), até as chamadas “respostas abertas” (ou seja, dadas pelo entrevistado de forma numérica ou textual). Outro, bastante próximo dessa questão, refere-se ao uso de escalas, opções de resposta que proporcionam a comparação por intervalos entre atitudes e opiniões. Os dois temas merecem o espaço de um capítulo quando não de um livro para serem bem explorados¹.
Nesse espaço, chamarei a atenção para alguns dos principais aspectos da categorização, abordando o tema “escalas” na próxima coluna.
Para aqueles que raramente se vêem na posição de construir um questionário, talvez o exemplo mais claro do uso problemático de categorias pré-determinadas seja o da variável “idade”. Imagine que você deve fazer uma pesquisa nas salas de aula dos dois primeiros anos de um curso universitário. Construindo rapidamente o questionário, você provavelmente tenderá a utilizar uma grade relativamente conhecida; os intervalos propostos pelo IBGE. A pessoa entrevistada deverá indicar sua idade e as opções pré-determinadas poderiam ser do tipo: menos de 20 anos, entre 21 e 25 anos, entre 26 e 30 anos, entre 31 e 35 anos, mais de 35 anos. Ao analisar a freqüência obtida com as respostas, muito provavelmente você se surpreenderia com o fato de 90% dos pesquisados estarem nas faixas “menos de 20 anos ou entre 21 e 25 anos”. Ou seja: sua variável “idade” (nesse caso, faixa etária) não terá nenhum poder para explicar os comportamentos, atitudes e opiniões que você observar na pesquisa. Nesse caso, é melhor deixar a resposta sem categorização prévia e realizá-la posteriormente, uma vez conhecida a distribuição das idades.
Mais complicado ainda é o caso de categorizar as chamadas respostas a perguntas de “razão” (quando se solicita ao entrevistado que explicite o motivo de sua resposta). Para tornar mais concreto o exemplo, suponha que você perguntou ao aluno da pesquisa acima se ele gostava do cardápio oferecido na lanchonete da faculdade e, diante da resposta negativa, perguntasse o “porquê”. A tentação aqui é a de criar categorias com um único termo (tipo: caro, barato, etc) que, por serem genéricas demais, não dão conta da diversidade de avaliações e razões de julgamento. É assim que perdemos o significado de uma resposta do tipo “muito caro para o tipo de alimento que oferece”, ao reduzirmos a resposta a “caro”.
Fica então, a recomendação: ao construir categorias você deve observar três condições.
A primeira é a da exaustividade, isto é: você deve criar tantas categorias quantas forem necessárias para que possa classificar todos os fatos, opiniões ou ocorrências obtidas. É claro que, uma vez classificadas as respostas, você poderá reagrupá-las em categorias mais abrangentes. Mas o primeiro nível da classificação tem, necessariamente, que ser detalhado. Não há espaço aqui para uma categoria “outros”, frequentemente muito maior do que as outras. Lembre-se que, uma vez categorizadas, perdem-se as respostas reais. Caso haja algum erro nessa fase, todo o trabalho deverá ser refeito.
A segunda condição a observar pelo seu trabalho de categorização é a da exclusividade, isto é: as categorias devem ser construídas de tal forma que qualquer fato ou acontecimento só possa ser classificado em uma única delas. Aparentemente simples, tal condição só costuma ser atingida quando se conta com uma equipe multidisciplinar para testar os diferentes significados da categorização elaborada. Para isso, solicita-se que um grupo multidisciplinar categorize uma amostra dos termos e expressões obtidos. Caso o projeto não conte com um grupo desse tipo, é necessário, ao menos, testar as categorias entre diferentes membros da equipe. Essa é a melhor maneira de evitar múltiplas interpretações.
A terceira e última condição para uma categorização eficaz é a pertinência das categorias construídas. Essa propriedade tem a ver com as diferentes áreas de análise e conhecimento. Do ponto de vista sociológico a análise dos discursos presidenciais no Brasil pode levar à interpretação de que o uso da palavra “povo” demonstra um desejo de proximidade (que, nesse caso, atuaria como categoria). Já um linguista, por exemplo, poderia trabalhar com a categoria “substantivo coletivo” sobre o mesmo texto. Nos dois casos, as categorias seriam pertinentes, cada uma dentro de sua área de conhecimento específica. Menos do que óbvia, a propriedade da pertinência nos alerta para a necessidade de fundamentar teoricamente as escolhas que fazemos.
Mas o risco maior na atividade de categorização acontece quando o autor – ou o leitor – deixando de lado as especificidades e características da construção das categorias – começa a tratá-las como entidades com vida própria. Nascem, assim, os estereótipos e os falsos sujeitos, do “populista” ao “jovem da geração Y”. Aliás, o que cada um deles significa mesmo?
1 – Cf. obra de Laurence Bardin sobre a Análise de Conteúdo para melhor entender as armadilhas da categorização de respostas abertas.
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